Quem foi criança há muito tempo, ou nem tanto tempo assim, e ainda lembra de algumas peripécias aprontadas, talvez tenha ficado com um nó na garganta ao saber que no último sábado 6 de abril o cartunista Ziraldo partiu aos 91 anos. Grande brasileiro, esse artista dos desenhos animados elaborou histórias típicas de um Brasil matreiro e animado, mas não só isso: editou jornais e revistas satíricos e irreverentes, embora eu lembre sempre dele em entrevistas e aparições, dócil e malemolente.
Foi ele quem deu tintas ao revolucionário e intrépido Menino Maluquinho, um pivete curioso e espertíssimo, com um espírito brincalhão que durante gerações marcou muitos, quase definindo o que era uma infância bem vivida. As brincadeiras juvenis de outrora – que nem sei mais se são tão presentes na criançada atual – tinham o carimbo da curiosidade e insurgência de cada cidadão mirim. Ao saber de seu falecimento, recordei de várias recreações dessas, que podem até ter outras denominações hoje em dia: picula, durinho, papai ajuda, barra manteiga, e outras tantas que desvelam a descoberta de ser gente.
Junto a Mauricio de Souza (talvez nosso maior idealizador de personagens infantis) articulou a fantasia da boa vivencia juvenil, com a “ Turma do Pererê” e o próprio Maluquinho (que cresceu e se tornou “um cara muito legal”). A “Turma do Pererê”, por exemplo, mistura diversão com folclore, nas aventuras do menino de uma perna só e um grupinho sagaz. O gosto de infância em cada adulto, tem um tanto dessa leitura e das artimanhas realizadas na vida de cada um. Ser criança tem esse lado lúdico e imaginativo, um tanto ilustrativo e próximo da sensação de liberdade plena. Obrigado Ziraldo!
Muito se fala das crianças contemporâneas, cada vez mais longe das ruas e próximas dos celulares. Pais – pra ficarem livres das aporrinhações dos filhos – deixam um tablet ligado passando qualquer coisa para entreter os pequenos. Mesmo considerando que criança sempre vai brincar, seja hoje ou no tempo das cavernas, realmente não sei o quanto convivências prematuras diante de telas e a inteligência artificial a substituir a criatividade de cada miúdo, vai prejudicar indivíduos no futuro. No entanto, a rebeldia de nossas criancinhas parece ser um pouco mais preocupante que o ato de se rebelar em eras passadas... Uma rebeldia mais simétrica a autoridade dos pais. Talvez, né? Posso estar até exagerando...
Além dos quadrinhos, Ziraldo foi um dos redatores do jornal “O Pasquim”, junto a outros cartunistas como Jaguar, Henfil, e jornalistas como Millôr Fernandez e Paulo Francis. Falando sobre sexo, drogas, feminismo e outros temas desafiantes em época de censura e repressão (Regime Militar) tornou-se um representativo de luta naquele período. Nos anos 1990, fundou a revista “Bundas”, que satirizava a “Caras”. O slogan era sensacional: “Quem mostra a bunda em ‘Caras’, não mostra a cara em ‘Bundas’ (ahahahahahahahahhahahaha...). Uma figura! Também caracterizou maravilhosamente vários mascotes dos times do nosso futebol.
Ide em paz, mestre! Uma geração que tu criastes e ilustrasse, vai ter um moleque morando sempre no coração.
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