Hoje me perguntaram do que mais eu sentia saudade na vida. Eu disse sem pestanejar: você! Saudade de tantas coisas. Desde sua presença física, às suas manias (quem diria), risada, ansiedade perto do seu aniversário e gastos fora do limite. E até da sua necessidade de ajudar a todos o tempo inteiro. Agora, se me perguntassem qual o meu maior desejo eu diria de imediato: sentar e conversar contigo.
Contar as novidades: da faculdade, dos momentos divinos com painho, da minha amizade com Dora, dos meus encontros e desencontros, do apartamento (você não chegou a conhecer) e do mundo tão louco. As vezes dou graças de você não ter estado aqui durante o COVID. Você iria rezar pela humanidade e era capaz de inventar sair de casa. Além da conversa eu ia te pedir duas coisas, que você fizesse panqueca (nin-guém faz igual a sua) e aquele bolo-mousse de aipim. Ah, queria mais uma coisa também, levar você para conhecer alguns lugares que acho que amaria. Aquela confeitaria que vende os pastéis de Belém, almoçar no Barbalho ou naquele restaurante que painho amou no Rio Vermelho.
E se pudéssemos realizar aquele sonho de viajar todos juntos? Já pensou? Você encantada com tudo, agoniada, com as suas melhores roupas e perfumes. E querendo comprar tudo - aqui eu e você somos igualzinhos rsrsrs. E você encantada com os lugares e descobertas. A gente iria rir. Adorava quando você ria de chorar. Os olhos ficavam pequenos e você envergava para a frente.
Só não queria que você me chamasse de Francisco kkkkkkk, pois eu saberia que seria alguma bronca ou "puxão de orelha". Queria deste momento só o lado suave, ou seja, você me chamando de "Cláudio". Algumas vezes me perguntam, raro, mas ocorre, se podem me chamar de Cláudio. Eu digo que sim, pois somente você me chamava assim e eu adorava.
Mas sabe o que mais eu gostaria, de tudo? Ouvir sua voz! Eu não lembro mais dela. É terrível isso, sabe? Já procurei alguns vídeos e achei um de uma viagem sua. Você toda atrapalhada gravando na câmera digital (hoje nem se usa mais, sabia? Eu uso rsrsrs) e você fala algo. Nem dá para entender. Eu volto várias vezes para ouvir. Sei que sua voz era doce um tanto aguda. Mas como era de fato? Sabia que agora a inteligência artificial (nem sei se sabes o que é isso rsrs) consegue transpor a voz da pessoa? Queria ouvir a sua. Queria te ouvir me chamar de "Fran".
Vou te contar uma coisa chata. Sabe um momento que lembro? Você agoniada no hospital querendo levantar-se e sem poder. Você não conseguia falar, pois tinha retirado a traqueostomia. Como foi difícil aquela noite, hem? Lembro também daquela vez, você intubada e comunicamos, eu e painho, que a filha de sua sobrinha tinha nascido. Os aparelhos se alteraram na hora. Mas tenho uma memória mais afetuosa, nosso último almoço. Depois de tanto tempo, conseguimos todos estar juntos. Havia meses que você estava no hospital. Você passou quase 48h em casa, depois foi embora e não mais voltou. Esses dias eu soube que você confessou a painho que sabia que não voltaria mais.
Olha, a saudade é imensa! Mas de tudo, o que eu mais queria era lembrar da sua voz. Talvez ela tenha virado um coração que bate forte quando eu falo (ou escrevo) sobre você, talvez ela seja este amor que cresce a cada dia ou a saudade amorosa. Talvez seja ela em mim quando digo "mainha˜. E aqui ela é você em mim, uma presença-ausente, uma dor-amor, um afeto sereno e suave, exatamente como eu me sinto agora ao escrever essas palavras.
Mainha, saudade de você!
P.S.1 – o título deste texto é de uma música de nome homônimo composta por Zé do Norte.
P.S.2 – a foto é da minha amiga, fotógrafa, Águeda Mascarenhas. E foi ela quem fotografou o último registro em vida, e com saúde, de mainha.
P.S.3 – este texto é dedicado, além de mainha, à Joyce Campos, amiga imensa de querida.
P.S.4 – depois de ler esse texto sugiro ouvir as músicas “Dez Anos”, com Gal Costa, e “Dio Come ti Amo”, com Gigliola Cinquentti.
Tristeza, doçura, afeto ou simplesmente amor. Sempre muito bom te ler por aqui
Que lindo e delicado esse teto amigo! Na primeira linha já estava com os olhos cheios de lágrimas. Lembrei de voinha e confesso que fiquei um tempo tentando me recordar da sua voz. Como é estranho isso. Depois de um tempo lembrei um pouco. Acho que não tenho registro em vídeo dela. Vou procurar. Obrigada por compartilhar essa lindeza. Cheiro. Sory
Quanta delicadeza, meu amigo. Consigo imaginar o som de sua voz nele. A presença da saudade é sinal de profundo amor
Que lindo texto!!! Emocionante!!! Tive que segurar as lágrimas!!!
Doce, profundo e marcante. Lembrei de minha avó. Me remeteu a uma frase de uma música da Maglore chamada Motor
"Sinto saudade já não me recordo porquê"