Por que queremos acelerar tudo, sempre e tanto? Que necessidade do imediato é essa que nos acompanha e alimenta cotidianamente? Será que o que temos agora não é o bastante, suficiente? Vivenciar cada coisa a seu momento é enfadonho, custoso, doloroso?
Sinceramente, essa aceleração constante das coisas, que beira o patológico (e às vezes o é), já me cansa faz muito. Nesta semana ficou mais evidente em mim a irritação e preocupação com isso. Você se identifica com a essa sensação sufocante ou apenas continua seguindo a corrente?
Eu não tenho a mínima ideia da amplitude desta coluna e, muito menos, se a sua resposta é de identificação ou não com a angústia sobre tal assunto, mas se não for pra escrever sobre o que me incomoda ou fazer uma pessoa – que seja – refletir com minhas palavras, melhor nem escrever.
Por isso, hoje escolhi preencher o meu e o seu agora com essa reflexão.
Ouvimos tanto a máxima “somos instantes”, mas me parece que, na verdade, o instante não significa tanto ou pesa demais pra nós! Temos que estar frequentemente como que correndo numa esteira, ansiando pelo próximo instante de contentamento. O que virá após um conjunto desses instantes, e o que devemos fazer quando eles finalmente chegarem, é grande parte do que nos move.
Vislumbrar, planejar, antecipar, prever, fazer e fazer.
Um exemplo tão claro do que quero questionar são os preparativos pro natal. Desde o final de outubro os grandes centros comerciais vinham organizando as decorações e eu pensando “que pressa é essa, gente, é sério?!”. Está bem, estamos falando de comércio e lucro. Mas e quando tudo isso ultrapassa o comercial e se infiltra no individual?
Porque o que vi acontecer foi exatamente isso.
À medida que novembro chegou e todos os shoppings estavam ornamentados com suas árvores e luzes, as pessoas foram se adiantando nas ornamentações em suas casas.
Quando é que sua mãe, pai, avó, ou quem quer que fosse seu modelo adulto, arrumava a casa para o natal durante a sua infância? Puxe da memória. Era no início de novembro? Creio que não.
Tradicionalmente, a preparação para as festividades de natal começa no primeiro domingo do advento, uma data flutuante, e que esse ano cai exatamente no dia de hoje.
Está bem, ninguém precisa seguir as tradições à risca, nem ser o super metódico. Não se trata disso. Trata-se do imediatismo extremo. De ter que correr com as coisas. Como eu disse, é apenas um exemplo, dentro de uma infinidade deles.
A sensação que tenho é que queremos acelerar o tempo, agilizar a chegada dos momentos que poderão nos dar (ou não) um alívio do dia a dia. Assim como queremos que chegue logo o fim de semana, o feriado. Queremos que o ano acabe logo, por ter sido um ano daqueles.
A gente quer pular pra “parte boa” (ou a que idealizamos como boa), a que nos convém.
Mas não estamos assistindo a um seriado ou diante de um áudio no aplicativo, onde podemos passar o que não nos agrada. Aquela parte incômoda ou chata, com a qual não queremos lidar.
Aqui é a vida, e temos que participar de todas as partes que a compõem. Sinto em dizer o óbvio, mas acho que não queremos enxergá-lo.
É tão ruim assim ter que vivenciar essas partes, que se somam no agora? Como vamos diferenciar as partes agradáveis, se pularmos tudo que nos é desagradável?
A relação com o natal é bem nítida. Querer avançar pro aconchegante, gostoso, bonito, satisfatório, de luzes, presentes e açúcar. Colocar o dedo pra provar a sobremesa antes mesmo de degustar o aperitivo.
Como saber se o seu agora vai ser completamente desagradável e privado de sobremesas, se você nem quer experimentar, e fica num eterno fast foward mental e comportamental?
E onde fica o aprender a se frustrar e adiar a gratificação? Porque uma das grandes verdades que temos ciência é que nem sempre vamos ter o que queremos, quando, ou como queremos. Não adianta querer viver como uma criança mimada que quer ter tudo ao seu tempo e maneira.
Aprender a viver a situação atual, o chato, sentir desconforto, tristeza e tédio; ter que usar máscara e álcool; ouvir o outro falar de coisas difíceis, sem poder acelerar pra frente. Sim, todos vamos precisar aprender a conviver com isso e muito mais.
Porém também podemos aprender, ao tentar viver cada momento presente, que nem tudo é tão entediante e/ou desconfortável como o que estávamos pensando, na hora que tivemos o ímpeto de apertar o avançar.
Podemos descobrir que novembro é bom, na medida do possível, mesmo sem antecipar excessivamente uma data que traz conforto; que talvez ouvir aquele áudio na velocidade normal quando temos tempo, faça a gente prestar atenção no que é importante e até rir com ele.
Poderia dar tantos exemplos disso aqui. Mas deixo o resto com você, pois já falei demais. Só te faço um breve apelo: não caia na armadilha ilusória do pensamento de que o que vem à frente será sempre melhor do que o que temos pra hoje. Afinal, aqui ou lá, continua sendo apenas você, tendo que lidar com o que surge, de novo, e de novo. E disso não há como fugir.
Para finalizar, trago o fragmento de uma música de Billy Joel que sempre me tocou, e que acredito ter bastante relação com o que falei aqui. Se te der vontade, coloca pra tocar. O nome dela é Vienna.
“Vá devagar, sua criança louca Você é tão ambiciosa para uma jovem Mas se você é tão esperta, me diga por que ainda tem tanto medo? Onde está o incêndio? Pra quê a pressa? É melhor você se acalmar antes que você perca tudo Você tem tanto o que fazer e tão poucas horas em um dia
Você sabe que quando a verdade é dita Você pode conseguir o que quer ou pode apenas envelhecer Você vai desistir antes mesmo de chegar na metade do caminho Quando você vai perceber? Viena espera por você.”
Por Sarah Ferraz - psicóloga, terapeuta cognitivo comportamental e servidora da Atenção Psicossocial de Salvador.
Instagram @psisarahferraz
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