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O LADO (B)ÉLICO DO LINKEDIN




A internet mudou nossa relação com o outro e com as coisas. Dela vieram as redes sociais que a cada dia estão nos convidando a remodelar nosso convívio intra e interpessoal. E não somente para o entretenimento, mas para o trabalho também. Há 21 anos atrás surgia, ainda que timidamente o LinkedIn, plataforma com foco nas relações de trabalho. O IN, como é conhecido, ajuda em novos contatos profissionais, auxilia empresas em processo seletivo, possibilita que candidatos achem empregos ou que os “caçadores de talentos” cheguem até eles.

 

O LinkedIn chegou e vem crescendo bastante. Há profissionais que são “influencers” nesta rede, com artigos, vídeos e postagens sobre o mundo organizacional. Há os selos que você pode colocar em sua foto, o “hiring”, quando a empresa está contratando ou “open to work” para quem está procurando um novo emprego, novas oportunidades. É possível anunciar uma promoção ou mudança de empresa, até mesmo um curso que a pessoa esteja realizando. É inegável a importância do IN nas relações de trabalho. De fato, ocorre um movimento de troca interessante e possibilidades empregatícias acontecem.

 

Mas, como já acontece nas redes sociais vizinhas, o IN pode ser um problema para profissionais e empresas. Para os primeiros, principalmente se a pessoa não estiver feliz no seu emprego ou estiver desempregada, torna-se desafiador lidar com a constante “felicidade” dos usuários. É impressionante como grande parte deles estão felizes com suas empresas e empregos, satisfeitíssimos, realizados e sempre, sem-pre, possuem uma palavra de incentivo para quem está passando por ali.

 

Os vídeos e fotos diversas são utilizadas como metáforas para falar de superação, autoestima, resiliência, mudança de “mindset” (palavrinha chata do mundo organizacional) entre outros aspectos. E por consequência o volume de comentários a favor são enormes. Não que não existam pessoas realizadas e felizes com seus empregos, há muitas e sou uma delas. Mas parece que o mundo é perfeito, sem arestas para aparar.

 

É comum vermos profissionais, que sabemos não serem grandes exemplos de ser humano, fazerem postagens belíssimas falando de altruísmo/empatia. A esquisitice chega ao ponto das pessoas que são desligadas de forma desrespeitosa elogiarem a empresa, falarem do bem que esta foi para elas e do quanto acolhem aquele momento que agora é de mudança e ressignificação (outras duas palavras muito utilizadas no jargão organizacional). Sim, devemos ter respeito pela empresa que saímos e o IN é visibilidade, não ficaria bem falar mal por uma questão de etiqueta. E o algoritmo se encarrega de unir as pessoas que são da mesma área/segmento. Mas daí, expor uma afeição e por vezes chamar o ambiente organizacional de família é bizarro.

 

Já as empresas, com suas postagens corporativas, mostram seus investimentos em pessoas, nos processos, os avanços tecnológicos, o apoio à diversidade, como são responsáveis socialmente, premiações conquistadas entre outras atitudes positivas. É óbvio que a companhia não vai fazer postagens sobre seu “lado B”. Assim como no Insta e no Tik Tok, a maior tendência é falar bem de si mesmo – apesar de alguns comportamentos diferentes estarem ocorrendo. Mas vender uma imagem que vai de encontro com a estrutura tantas vezes bélica que as empresas possuem, com desrespeito aos profissionais, não pagamento e atraso de salários, e estruturas que afetam a saúde mental dos colaboradores, é não só contraditório, como imoral.

 

O risco do que vem ocorrendo no IN é que ao invés de ser um lugar de troca, possibilidade de aprendizado e emprego, torna-se uma vitrine de vaidades e mentiras. Um campo minado em que carreira e crescimento são uma maratona. Chega ao pódio o mais perfeito, o “cordeirinho”, aquele que não só acolhe as farsas, mas as propaga. O que é no mínimo doentio e cruel com si mesmo e com os outros.

 

Há dias atrás uma pessoa próxima falou comigo que saiu mal do IN depois de alguns minutos por lá. Motivo? O mundo era da perfeição! Eu falei que infelizmente era assim e que tentasse não se deixar perturbar pela ilusão ali propagada. De fato, estamos aprendendo a lidar com esse contexto de redes sociais. Já vemos dados sobre o impacto na autoestima, fazendo com que as pessoas se sintam as piores ao olharem as redes.

 

Agora, quando isso chega ao mundo corporativo os contornos são bem mais perigosos, pois a máquina que move o capitalismo está ali com toda a sua aura. Se por um lado o IN facilita, ele também orquestra um mundo das organizações e dos seus funcionários, limpo, humano e acolhedor. O que sabemos não ser por inteiro. E se ali é para ser um ambiente de troca, também se faz necessário falar do que precisa ser melhorado ou das mentiras organizacionais. Sim, há perfis assim no IN, mas por vezes se perdem por não discutir, mas apenas atacar. Ou seja, é uma rede onde se fala o que o outro deseja ouvir: que tudo está bem, que estou feliz, que minha empresa é modelo! E com isso, o capitalismo com seus tentáculos segue adoecendo mentes e corpos e os fazendo pensar que são especiais.


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10 Comments

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Xico, excelente tema! Observamos que a humanidade sofre com baixa autoestima, cheia de inseguranças, necessitando de autoafirmação, sempre tentando convencer o outro do seu sucesso!

Coisa brega, cansativa, desinteressante e altamente contaminante (vigio).

 

“Nunca conheci quem tivesse levado porrada

Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo”

Fernando pessoa

 

“Quando você ficar triste, que seja por um dia

E não o ano inteiro

E que você descubra que rir é bom

Mas que rir de tudo é desespero”

Frejat

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É isso, minha amiga! As necessidades são muito maiores 🥲.

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Estava refletindo sobre o ambiente corporativo e redes sociais e vejo exatamente o reflexo das redes vizinhas, não se trata de vida real…

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Isso é enlouquecedor e adoecedor!

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Li e achei super interesse a reportagem. Realmente, torna-se evidente que as plataformas muitas vezes se transformam em uma vitrine de vaidades e inverdades. O LinkedIn não escapou.

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Triste isso!

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Excelente reflexão. Essas são as armadilhas das redes sociais. Precisamos ter muita criticidade para não cair nelas. Outro dia, vi uma postagem de uma pessoa que tinha uma postura super tóxica no trabalho se descrevendo com uma pessoa que tem como objetivo de carreira, desenvolver pessoas. É realmente uma cilada Bino.

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E isso é tão comum. E o pior: as pessoas compram como verdade.

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O texto descreveu bem o ambiente do tal IN que deixa a gente super OUT porque mobiliza um jogo para atrair novos empregadores e garantir o empregador atual. Detalhe super importante: muitos textos feitos por funcionários não são escritos por eles! Agências especializadas com bons redatoras escrevem esse material. Fui uma dessas pessoas! De posts pessoais a pensamentos sobre o trabalho. Puro ghost writing!

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Cho-ca-do!! Ou seja, é mais problemático ainda.

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