Quem nunca ouviu a famosa frase "meus filhos são minha vida"? Ela é como um mantra que ecoa pelos cantos da sociedade, carregado de amor, dedicação e, talvez, alguns excessos. É uma declaração poderosa que reflete a ênfase que nossa cultura coloca na parentalidade como o alicerce central da existência. Sem dúvida, cuidar e educar nossos filhos sempre foi uma parte fundamental na existência do ser humano. No entanto, vale a pena olhar mais profundamente para o que essa afirmação implica e como ela molda nossas vidas.
Vivemos em uma época em que a pressão sobre os pais atingiu níveis sem precedentes. Se essa pressão já é intensa para os pais, podemos imaginar o quanto é ainda mais acentuada para as mães, que frequentemente enfrentam expectativas mais altas nesse aspecto. A expectativa é que elas se sacrifiquem ao máximo para garantir que seus filhos tenham a melhor educação possível e desfrutem de atividades de lazer enriquecedoras. É comum ver pais e mães investindo horas intermináveis de trabalho e recursos financeiros significativos na criação de seus filhos. Isso certamente reflete o amor e a dedicação dos pais e mães, mas também revela as demandas adicionais impostas pelo sistema capitalista, que nos leva a trabalhar ainda mais para atender às novas "necessidades" que ele cria. A vida está se tornando mais dispendiosa, e criar filhos parece estar acompanhando essa tendência de aumento de custos.
No entanto, à medida que os filhos crescem, começam a trilhar seu próprio caminho, seja ingressando no mercado de trabalho ou buscando independência ao sair de casa. Nesse momento, surge uma questão crucial: como pais e mães lidam com a transição de uma vida centrada nos filhos para uma vida onde os papéis parentais precisam ser redefinidos?
O tão mencionado "ninho vazio" é um estágio da vida que pode ser desafiador para muitas pessoas. Aquelas que moldaram suas vidas e identidades em torno do papel de cuidadoras podem sentir que estão perdendo o chão, enfrentando um vazio emocional e uma sensação de perda de propósito.
Neste ponto, entra em cena uma questão de grande importância sociológica e psicológica. Como sociedade, precisamos refletir sobre como nossas expectativas em relação à parentalidade estão afetando o bem-estar emocional dos nossos pais. Além disso, é crucial explorar como os pais e mães podem se preparar para essa transição, mantendo uma identidade independente e encontrando novos significados em suas vidas.
A mensagem essencial é que a maternidade e a paternidade são aspectos fundamentais da experiência humana, mas não devem servir como um substituto para sua própria autonomia. Devemos encorajar nossos país e nossas mães a buscarem um equilíbrio entre seu papel parental e sua própria realização pessoal. É fundamental entender que, à medida que os filhos crescem e trilham seus próprios caminhos, isso não representa um abandono, mas sim uma evolução natural das dinâmicas familiares.
Isso me lembra que a sociologia nos lembra que a parentalidade é uma construção social e que as expectativas em torno dela podem ser redefinidas, portanto, não há regras inflexíveis a serem seguidas. Cultivar uma identidade pessoal sólida e cuidar da saúde mental são passos cruciais para que os pais e as mães enfrentem o "ninho vazio" com confiança e realização, contribuindo para uma sociedade que valoriza não apenas a parentalidade, mas também a individualidade e a autonomia de seus membros.
Navegando pela internet e pelas redes sociais, especialmente nos espaços de discussão, como os comentários no TikTok ou no YouTube, podemos observar que a grande maioria das pessoas que enfrentam esse sentimento são as mães. Isso se deve, em grande parte, ao machismo estrutural que estabeleceu a ideia de que a maior parte dos cuidados com os filhos deve recair sobre as mães. Como resultado, os pais muitas vezes mantêm suas redes de sociabilidade intactas, enquanto as mães acabam perdendo essas conexões e se dedicando exclusivamente aos filhos. Essa dinâmica gera problemas tanto para as mães quanto para os filhos, e é possível encontrar inúmeros relatos e casos desse fenômeno na internet.
O chamado "ninho vazio" é um estágio que pode ser desafiador para muitos pais. Segundo os psicólogos Naiana Paula Donida e Sandro Rodrigo Steffens, a Síndrome do Ninho Vazio é uma condição que ocorre quando filhos adultos deixam o lar dos pais, desencadeando sentimentos de perda e vazio entre os pais. Esse fenômeno tende a impactar mais profundamente as mães devido à sua longa história de desempenhar papéis centrais na dinâmica familiar, com identidades muitas vezes ligadas ao papel de mãe e cuidadora dos filhos. Com a partida dos filhos, as mães podem experimentar uma sensação de perda da função e da identidade primordial, o que, por sua vez, pode afetar sua autoestima e bem-estar emocional.
Aqui entra uma questão importante: como uma sociedade, precisamos considerar como nossas expectativas sobre a parentalidade afetam o bem-estar emocional dos nossos pais. Além disso, devemos explorar como os pais e mães podem se preparar para essa transição, mantendo uma identidade independente e encontrando novos significados em suas vidas.
No Brasil, somos desafiados por uma questão adicional e intrincada: o forte machismo estrutural. Há uma narrativa cultural persistente que insiste que a dedicação total das mães aos filhos é algo inato e esperado. Esse mito influencia muitas mães, levando-as a acreditar que, após dar à luz, suas vidas devem se resumir a cuidar e dedicar-se exclusivamente aos filhos. No entanto, essa crença é uma armadilha que merece ser criticada em todos os lugares.
O amor de uma mãe por seus filhos é indescritível, mas é fundamental compreender que há um limite para essa dedicação. A dependência dos filhos durante sua criação é uma fase temporária; eles crescerão, desenvolverão independência e partirão do ninho. É crucial que as mães reconheçam que suas vidas não se extinguem quando os filhos seguem seus próprios caminhos.
Se uma mãe se enxerga apenas como mãe e nada mais, enfrentará desafios quando os filhos se tornarem independentes. A saudade é inevitável, mas também é possível encontrar paz na compreensão de que a vida de uma mãe é mais ampla do que apenas a maternidade. Como já foi citado, é assustador as diversas histórias compartilhadas online que refletem a angústia resultante desse vínculo excessivo, afetando não apenas as mães, mas também seus filhos e toda a dinâmica familiar.
A mensagem essencial é a necessidade da reflexão. Se você tem pais, mães, amigos ou entes queridos passando por essas situações, é fundamental encorajá-los a considerar outras perspectivas, a procurarem viver de forma mais abundante, tendo novas experiências, novas amizades e relacionamentos. Buscar ajuda profissional, como a terapia, pode ser uma solução valiosa. É essencial compreender que a sociabilidade, o convívio com outras pessoas, a prática de esportes, a dança e a busca por uma vida plena são partes essenciais da autonomia.
Como sociólogo, enxergo a sociabilidade como um dos fenômenos mais poderosos da existência humana e para as mães que já estão nesse sofrimento eu digo: a sociabilidade pode amenizar essa dor. Através dela, alcançamos nossos maiores feitos e vivenciamos experiências significativas, independentemente de serem positivas ou desafiadoras. Mães e pais, vocês são muito mais do que seus papéis de cuidadores. São indivíduos que merecem viver vidas plenas e significativas, além de cuidar e amar seus filhos. A sociabilidade é um presente, não uma prisão. Em última análise, todos nós precisamos de conexões, interações e um propósito em nossas vidas. Portanto, é vital lembrar que você é único e merece viver plenamente e não em função dos filhos.
FONTE:
Donida, N. P., & Steffens, S. R. SÍNDROME DO NINHO VAZIO: SENTIMENTOS DAS MÃES EM RELAÇÃO A SAÍDA DOS FILHOS DE SUAS CASAS. Anuário de Pesquisa e Extensão, 2018. Acesso em: https://periodicos.unoesc.edu.br/apeusmo/article/download/19674/10443/65187.
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