MAIS UMA VÍTIMA DO MODELO FRACASSADO DE SOCIEDADE
- Alan Rangel
- 30 de out. de 2023
- 3 min de leitura
Atualizado: 1 de nov. de 2023

O suicídio do humorista influenciador baiano, Rodrigo Amendoim, de apenas 24 anos, em Lauro de Freitas, região metropolitana de Salvador, no último dia 28 de outubro de 2023, é mais uma comprovação da permanente sensação de que adoecemos, na primeira pessoa do plural, enquanto sociedade.
Assisti a um vídeo curto de Amendoim, circulado após a sua morte. Em resumo, falava sobre suas conquistas materiais; só que não conseguiria ser feliz porque não era reconhecido pelo que fazia. No próprio vídeo, dizia que se sentia feliz pelas pessoas próximas, mas que ele não entendia a cobrança excessiva por ser sempre melhor no que faz, por não poder ser feliz do seu próprio jeito, e pelas pessoas ignorarem os seus sentimentos além das aparências.
O nosso modelo de sociedade ocidental individualista, competitiva e consumista ao extremo, exportada para o globo, já vem fracassando há tempos. Os sinais estão em todo lugar. Só para pegar o caso do Brasil, a cada 45 minutos uma pessoa tira a própria vida. E para cada morte mais outras 20 tentativas. E no mundo? Anualmente mais de 700 mil pessoas cometem suicídio. É a ação mais extrema que o humano pode fazer consigo mesmo. Mas e o número de pessoas que tem adoecido por conta da depressão, e que também pode levar ao suicídio? Segundo dados da Organização Panamericana de Saúde, 300 milhões de pessoas, de todas as idades, sofrem com a depressão.
Que lição precisamos aprender? A culpa de um transtorno mental, como a depressão, é somente da pessoa? Não, a origem real é externa. Apesar das disposições genéticas mais acentuadas que podem desencadear em alguns indivíduos, a origem é multifatorial.
Direciono meu olhar ao modelo de sociedade em que estamos imersos. A partir do momento em que decidimos apostar em um estilo de vida apartado das pequenas comunidades, onde jaz amigos, parentes e familiares, o que remonta desde a formação dos grandes impérios e territórios, das grandes cidades, e distantes da própria coexistência com a Natureza e sua linguagem natural, começamos a adoecer lentamente.
Émile Durkheim, grande sociólogo francês, falava da importância da coesão moral, dos valores compartilhados em grupos - muito comuns em sociedades mais primevas -, recomendava que em nossas sociedades complexas, material, geográfica e populacional, deveríamos emular os povos tradicionais. Uma tentativa de manter a saúde social, uma coesão moral, pois o indivíduo fora da comunidade é um ser incompleto e indomável. Isso já numa época tardia, em que a feição de vida individualista começava a ganhar relevo, típico das sociedades de massas do século XX e pioradas na contemporaneidade.
A verdade é que não somos autossuficientes. É ilusão acreditar em um projeto de sociedade em que egos isolados, muitas vezes dominados pela apologia do status, fama, posição social e bens materiais, se encontrarão em algum lugar paradisíaco. Na realidade, precisamos restabelecer um projeto de comunidade, com vínculos permanentes, com pessoas próximas, e uma vida mais cooperativa, coletiva, afetuosa, cuidadosa, e menos competitiva, conflituosa e isolada. É necessária uma reconexão com nós mesmos, mais em simbiose a uma concepção ontológica ecossistêmica e espiritualista, muito maior que o androcentrismo que inventamos. Descentralizar o humanismo.
Precisamos reelaborar aonde queremos ir e para quê.
Devemos também reelaborar a nossa relação com aquilo que produzimos, através do trabalho, e como distribuímos o que produzimos, pois uma vida direcionada ao cada um por si, pela sobrevivência insana diária, em uma brutal miséria social, gera pessoas cada vez mais frágeis, ansiosas, desesperadas, debilitadas e sozinhas, destituídas de um sentido de vida mais essencial, invisível aos olhos, invisível á impermanência das cobranças e punições diárias, invisíveis à volatilidade cotidiana.
A cada transtorno mental adquirido; a cada esgotamento físico; a cada nova vítima que tira sua própria vida é uma derrota do modelo civilizacional que optamos. Ou damos um novo rumo ao estilo de vida social, ultrapassando os padrões de comportamentos destrutivos, ou cada vez mais afundaremos sem perspectiva de sobrevivência, tapando o sol com a peneira, para atender aos interesses daqueles que amam o poder, vivendo sobre corpos simbolicamente, psicologicamente e fisicamente aniquilados.
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Importante! Precisamos reaprender a conviver sem a competição.
Ótimo ensaio, Alan. É um desafio mesmo pensar em modelos coletivos de existência, principalmente nas democracias liberais com seu eu soberano como única instância válida e confiável