Imprimindo impressões sobre o voto impresso
- Carlos Henrique Cardoso
- 21 de mai. de 2021
- 3 min de leitura
Em 1993, um deputado federal pelo Rio de Janeiro defendia a informatização das eleições – que seria implantada em território nacional em 1996 – para superar a utilização de cédulas nas eleições e “combater as fraudes”. Após quase três décadas, esse mesmo deputado é o atual presidente da República e passou a defender o voto impresso para “combater as fraudes”.
À medida que o então deputado ganhava destaque e adeptos, essa cantilena ganhou corpo e no último dia 13 de maio foi instalada uma comissão especial para analisar o projeto da impressão de um bilhete após o eleitor digitar os números dos candidatos escolhidos na urna eletrônica. Não haveria, nessa impressão, nenhuma informação nem dados do eleitor. Segundo os apoiadores da ideia, somente o voto digital não dá “segurança jurídica”, e possibilita indícios de eleição burlada.
Por outro lado, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou uma campanha com a finalidade de garantir a segurança da urna eletrônica, explicando todo o processo, do desenvolvimento do programa até a totalização dos votos. Durante 25 anos, jamais houve uma séria denuncia de fraude nas 13 eleições cobertas por esse equipamento, assegurando sempre sua confiabilidade.
Porém, houve controvérsias. Em 2014, o candidato à presidência Aécio Neves solicitou ao TSE recontagem de votos após derrota para Dilma Rousseff. A diferença de pouco mais de 3 milhões de votos foi aceita pelo tribunal para justificar nova conta e a vitória da petista foi confirmada. O PSDB solicitou ao TSE o voto impresso em 2015 e a discussão sobre a desconfiança da urna eletrônica nunca mais saiu de pauta...
Em janeiro deste ano, logo em seguida a uma invasão ao Congresso Nacional dos Estados Unidos (Capitólio) por simpatizantes do derrotado Donald Trump, o nosso presidente afirmou que “no Brasil será pior, caso não tenha voto impresso em 2022”. Dúvida do funcionamento de nossas instituições é pouco...
Com o passar dos anos, qualquer desenvolvimento implantado há algum tempo deve passar por mudanças, atendendo as transformações tecnológicas ou novas demandas sociais. Normal. No entanto, provocar alterações ao bel prazer, sem a dinâmica a ser considerada ter realmente suscitado uma forte objeção e rejeição majoritária significa querer estabelecer, à fórceps, seus desejos mais intransigentes, com doses cavalares de autoritarismo. Através dessa mesma urna, foi eleito o atual presidente, diversos simpatizantes seus e uma horda de pregadores do voto impresso.
Alguns analistas têm visto com bons olhos essa opção e aceitado a proposta. Contudo, acatar esse recurso após ameaças (“em 2022 será pior”) é concordar que impor vontades com bravatas é um caminho possível. Péssimo exemplo! A questão não é a importância em atender aos requisitos propostos para discutir a materialização do voto. É pegar carona num bonde verbal desgovernado e direcionado por um presidente fanfarrão! É agir como um pai que decide dar um doce a uma criança mimada que resolveu fazer um escândalo para conseguir a guloseima.
O custo para realizar esse feito é estimado em 2 bilhões de reais, segundo ministro Luís Roberto Barroso. Beleza pro “cidadão de bem”, pagador de impostos, cobrir esse investimento, contanto que seja da vontade do político de estimação. Barroso também afirmou que houve um projeto piloto em 2002 com impressão de votos pela urna eletrônica, em 6% delas, porém, não deu certo, pois “houve filas, atrasos, aumento de votos brancos e nulos, emperramento de impressoras”.
Muito provavelmente, a matéria passará pelas instâncias do Parlamento sem discussão popular, audiência pública, de maneira açodada, só pra atender os anseios do poderoso chefão.
É bom que todos que chegaram até aqui tenham gostado. Senão, a indignação no próximo texto será pior.
FONTE:
IMAGEM: Revista Oeste
Comments