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Foto do escritorKelly Lidia

HOMEM: TÍTULO SUJO



Definitivamente, não anda muito favorável ser homem hoje em dia! 


Uma vez eu perguntei a um homem cis: 

  • ‘’Você é hetero?’’

Ele me disse:

  • ‘’Deus me livre gostar de homem.’’


Outra vez, uma amiga travesti me disse:

  • ‘’Eles não estão prontos pra essa conversa ainda, mas falou homem, sendo cis ou trans: não presta.’’


Aí naquele dia (em muitos deles), numa situação social, eu disse assim:

  • ‘’Odeio os homens.’’[1] 

E uma voz misteriosa (sempre tem uma, ou mais de uma) me respondeu:

  • ‘’Eu também.’’  


Minha mãe sempre vive me dizendo:

  • ‘’[...] eu não ia botar homem dentro de casa [...]’’


Um camarada num grupo de zap disse assim:

  • ‘’[...] acho que teríamos menos guerras se as mulheres estivessem no poder.’’

Daí eu respondi:

  • ‘’Eu acho que a forma de socializar os corpos poderia ser diferente. Assim, poderíamos tentar viver num ambiente mais equilibrado e com menos necessidade de provar a honra pelo gênero.’’[2]



Esse, e outro conjunto de situações/conversas me fizeram refletir a respeito dessa categoria heterogênea nomenclaturada homem.  


Ingenuamente, em um primeiro momento, até me perguntei ‘’por que será, hein?’’, mas daí me lembrei que mesmo tendo sido criada em um lar feminino e mesmo me relacionando com homem transviado, mulheres e não bináries nos últimos 5 anos, ainda existem homens no meu cotidiano que elucidam muito bem qual a resposta dessa pergunta.


Embora a tentação de contar causos seja imensa[3], neste espaço eu gostaria de abordar sobre coisas um pouco mais enraizadas. 


A gente sabe que a sociedade é estruturada, entre outras coisas, por um fenômeno escroto: o machismo, que privilegia o homem em detrimento de todas as outras categorias de gênero. 


Essa dimensão é tão grande que há séculos se alimenta no imaginário social a ideia de que esses homens são possuidores de todos os direitos e coisas, inclusive a vida de outras pessoas (menos dos próprios homens, a não ser que a honra esteja ameaçada).


Mas, embora pareça que a categoria homem é homogênea, quando falamos dessa forma, as lutas do movimento negro, do novimento negro feminino, das pessoas trans e não binárias, dentre outras, contribuem muito bem para a compreensão de que essa categoria é, na verdade, bastante heterogenea. 


Dessa forma, nem todos os privilegiados serão privilegiados e nem todos os subalternizados serão subalternizados. Eis a dimensão de interseccionalidade[4]. 


Então, de que homem estamos falando? Uma vez que, se o machismo também afeta a alguns tipos de homens, ele se perde no seu próprio objetivo, logo, sua essência é falaciosa. 


O que podemos observar é que: em alguns campos, alguns privilégios estão mais que garantidos, enquanto em outros, o que resta é a pressão social de ser e se comportar correspondendo a expectativas, muitas vezes inalcançáveis para determinadas realidades. 


Sendo assim, os estereótipos em torno das masculinidades, além de matar aos outros, fazem com que a categoria se deteriore por dentro. 


Geracionalmente, já conquistamos a possibilidade de refletir acerca de certos aspectos. Coisas que nossos ancestrais mais próximos nem sonhavam em pensar. Mas como as crianças estão sendo socializadas, hoje?  


Inegavelmente, os grupos ditos minoritários estão se lançando em suas agendas de luta e reivindicando para si o compromisso na construção de algo menos escroto, uma vez que, uma dimensão conquistada não melhora apenas a qualidade de vida daquela categoria, mas da sociedade como um todo. 


Para mim, o questionamento que permanece é: e você, homem que está sendo massacrado constantemente pelo machismo, o que anda fazendo para modificar essa realidade?[5]


_____

Notas: [1] Eu não odeio os homens, (apenas eventualmente)!


[2] Não pretendo reduzir o debate apenas à questão da honra.


[3] Mas caso você queira se embriagar de causos e fofocas que envolvem a categoria masculina, deixo a sugestão do novo livro da colunista Karla, intitulado: Meus causos: 13 contos sobre encontros desastrosos com homens. Para mais informações: @karla.expansiva.dilacerante ou (71) 9 9712 2801


[4] Para compreender melhor sobre o tema sugiro a obra: Interseccionalidade, da Carla Akotirene, pertencente a coleção Feminismos Plurais. A autora não cunha o termo, como muitos podem pensar, entretanto, contribui significativamente para as reflexões/estudos aqui no Brasil. 


[5] Vale a pena conhecer o texto do colunista Murilo Nonato, intitulado: A GENTE NÃO NASCE HOMEM, TORNA-SE HOMEM (PARTE I) – A CONTRIBUIÇÃO DO FEMINISMO PARA AS REFLEXÕES SOBRE AS MASCULINIDADES‘’. Para ler, clique aqui.


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6 Comments

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Realmente faltam movimentações mais fortes. O que é um perigo, principalmente quando se trabalha e estuda em ambientes majoritariamente dominado por estes tipos de personas machistas.


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Bem, pontuado. Como não se contaminar, né? Tarefa difícil ir contra a "própria" comunidade

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Como bem apontou, a masculinidade como exercício impõe subalternizar até outros homens. É uma identidade que por definição se utiliza da violência para se legitimar. A masculinidade é uma máquina de moer gente, seu combustível é a violência. É cada vez mais acredito nisso que vc está fazendo no texto: chamar os homens para a responsabilidade de disputar outras formas de ser homem!

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Não é tarefa fácil, mas que bom que nomes como o seu se engajam no movimento. Deposito confiança nessa e nas próximas gerações.

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Ahhhh amigue! Até emocionei aqui por ser indicada em um texto seu 🥲. E o texto casa bem com uma dimensão que tenho feito com várias pessoas homens na minha vida. Estou sempre questionando eles a respeito do que tem feito sobre o assunto, afinal, vejo que mesmos os desconstruídos se refugiam nas mulheres e nas falas deles para se desconstruirem. Passou da hora deles travarem a batalha de elaborar um masculinismo que elabore outra dimensão de ser homem, até porque muitos alegam q desde que a mulheres foram para a vida pública, eles não sabem mais qual o papel deles. Pois que corram para descobrir isso! E venham até nós com boas discussões e com resultados efetivos!

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Definitivamente, sim, Carla. Aguardando, sempre, os bons resultados e elaborações das masculinidades. E obrigada você pela dialética inspiradora.

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