Houve um tempo onde exigir que alguém parasse de chorar não era considerado um ato de violência. Houve um tempo onde sentir e demonstrar tais questões ao mundo externo era considerado fraqueza. “Ela é muito chata”; já ouvi-os dizer. Acontece que me colocaram em um lugar que eu não queria estar e disseram: “fique feliz por isso”, quando na verdade ninguém pensou na possibilidade de questionar o que realmente me faria feliz. Eu sou mais feliz quando não sou obrigada a ser. Gosto de brincar com formigas e gravetos, me entretenho com as nuvens e levanto quando ralo o joelho. Eu sou feliz quando não sou obrigada a sorrir sem vontade, a ser educada com quem desrespeita e segrega. Eu sou mais feliz quando me deixam ser desbocada, falante, tagarela. Eu sou mais feliz quando não sou obrigada a ser.
Agradeça por tudo que você tem, mesmo que isso seja apenas aquilo que é necessário para sua sobrevivência. Seja grato pela água quente que te deram e observe-os beber água gelada sob o sol de quarenta graus de Salvador. Não é sobre justiça, é? Me questionei essa semana onde eu aprendi a ter respeito por aqueles que ninguém respeitava. Me perguntei de onde vem essa sede de justiça, essa honestidade sem espelho. Talvez eu não saiba quem eu quero ser. Essa definição nítida parece muito turva diante do meu olhar, mas eu tenho claro o que eu não quero ser. Sei o que eu jamais faria, independente da circunstância.
Minhas crenças pessoais sempre passaram longe de tudo aquilo que me foi pregado. Eu sou mais feliz quando não sou obrigada a ser. Quando convidei um grande amigo para visitar a religião que costumava frequentar e ele não se sentiu à vontade, não entendi o motivo de apenas minha reafirmação de que ele é bem vindo do jeito dele não foi suficiente. Ele precisava ser feliz sem ser obrigado a ser. Sorrir entre hipócritas que te cumprimentam mas, na verdade, levam em consideração a doutrina com mais ênfase do que a própria humanidade do indivíduo. A humanidade é diversidade. Quanto tempo vocês vão demorar para chegar nessa resposta óbvia? Não adianta gritar, maltratar ninguém por ser quem ele é. Isso irá matá-lo ou fortalecê-lo. Ou o fará definhar.
Percebi desistências pessoais baseadas no definhamento vindo da violência contra meu ser. Frases que foram expostas como brincadeira, atitudes que carregaram consigo risos e que, na verdade, paralisaram meus projetos durante anos. Paralisei minha busca por mim mesma por conta de gritos externos que buscavam nada além de injúria. Seria inocente demais se afirmasse hoje que eles já não mais me afetam. Mas agora, pela primeira vez, me vi em consonância com a racionalização dos fatos que, para minha alegria, me alertaram diante de mais uma possibilidade de desistência. Quem grita de lá desistiu faz tempo. Paulo Freire trouxe uma reflexão que levo comigo e nesse momento, me é benquista: “Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor.” E eu sinto muito. Sinto por aquelas violências traumáticas as quais você foi vítima. Hoje sou uma mulher adulta que não irá sucumbir às suas dualidades por medo de errar e te decepcionar, porque, infelizmente, venho percebendo que mesmo se eu acertar, isso é uma decepção para você.
Tire-me de sua mira doentia. Eu não sou e não quero ser você. Não me diminua aos traços hipócritas socialistas os quais você defende. Cansei de teorias e ideologias. Eu quero acreditar em mim e nas pessoas as quais eu escolhi e escolho todos os dias para manter em minha vida. Queria que você tivesse a mesma certeza de si, sem precisar pisar, depreciar e diminuir os outros. Mas não vale a pena dar murro em ponta de faca. Minhas mãos estão sangrando, doloridas. Já não tenho energia para lidar com suas palavras afiadas e pontudas. Mas eu já as enxergo. E isso é um grande avanço.
Você prometeu naquela música que iria me ensinar a ser feliz. Mas como conseguiria cumprir essa meta se nem você mesmo descobriu o que é a felicidade? Talvez ninguém tenha descoberto e tá tudo bem. As dificuldades da vida me mostraram o que é tristeza, frustração e desistência. Agora cabe a mim decidir o que me faz feliz. Obrigada pela troca. Daqui pra frente fica por minha conta. Eu terei que decidir o que farei e terei que lidar com as consequências de forma individual, levando em consideração a maturidade que adquiri durante essa caminhada. As fronteiras foram enfrentadas, assim como as tempestades naturais. Mas jamais haverá uma forma de conquistar meu mundo ou meu espaço.
Buscar a felicidade é um ofício mais próspero.