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DEUS, O SER, E O ESTAR




Desde a antiguidade, a relação entre ser e estar tem sido uma questão fundamental na filosofia e na teologia. No âmbito linguístico, algumas línguas distinguem o ser essencial do estar circunstancial, enquanto outras utilizam um único verbo para ambos os estados. Essa distinção nos leva a um questionamento central: como falar sobre Deus dentro dessas estruturas?


Na tradição judaico-cristã, Deus é frequentemente descrito como Aquele que É. Em Êxodo 3:14, quando Moisés pergunta o nome de Deus, a resposta dada é frequentemente traduzida como "Eu Sou o que Sou". A escolha do verbo "ser" nessa passagem carrega um peso ontológico significativo. No hebraico bíblico, a ausência de um verbo explícito para o presente faz com que a própria existência de Deus seja afirmada sem limitações temporais. Deus não apenas é, pois  – Ele transcende o tempo e o espaço, sendo ao mesmo tempo passado, presente e futuro.


Já no grego do Novo Testamento, encontramos Jesus utilizando a expressão egó eimí, que pode ser traduzida tanto como "Eu sou" quanto "Eu estou". Essa ambiguidade da essência e a manifestação de Deus. Ele não apenas é o princípio absoluto do ser, mas também está presente na história, na existência humana, no tempo e no espaço.


Em contraste, em português e espanhol, distinguimos entre "ser" e "estar", separando a identidade eterna da presença momentânea. Essa separação, no entanto, não se aplica a Deus. Ele é a própria essência do Ser, mas também está no mundo, agindo na história e se revelando ao ser humano. Assim, Deus não pode ser reduzido a um verbo ou a uma estrutura linguística. Ele É absoluto e eterno, mas também está próximo e atuante. Em Deus, ser e estar se fundem, pois Ele é Aquele que simplesmente É.


Séculos depois, Jesus se apropria da mesma estrutura ao afirmar:"Antes que Abraão existisse, Eu Sou" (João 8:58). Aqui, o tempo se dissolve. Jesus não diz "Eu fui", como seria esperado, mas "Eu Sou", revelando Sua eternidade e Sua identidade divina. A força dessa expressão não se limita ao campo teológico. No existencialismo, Jean-Paul Sartre afirmou que "a existência precede a essência". Para o ser humano, a identidade é construída ao longo da vida. Não nascemos com uma essência fixa; precisamos "nos tornar". Mas Deus não se torna – Ele simplesmente É.


Na tradição mística, o "Eu Sou" é também um convite para a experiência do sagrado. Quando dizemos "Eu Sou", não estamos apenas afirmando nossa identidade, mas reconhecendo nossa existência como reflexo da realidade. No silêncio da contemplação, encontramos o eco dessa voz primordial: o "Eu Sou" que ressoa no mais profundo do nosso ser.


Portanto, quando nos perguntamos "Quem sou eu?", podemos nos lembrar da resposta que Deus deu a Moisés. Pois, em última instância, ser é participar do mistério daquele que É. Assim, somos quem somos ao ser sendo!


IMAGEM: Respostas Bíblicas

6 comentários

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O texto reflete sobre a distinção entre "ser" e "estar" na linguagem e como isso influencia nossa compreensão de Deus. Mostra que, em Deus, essas categorias se fundem: Ele é eterno e também presente. Um convite à reflexão sobre a própria existência à luz do divino.


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Cremilce Luz de Santana
há 4 dias
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"Em Deus, ser e estar se fundem, pois Ele é Aquele que simplesmente É." O texto nos leva a uma dimensão do real, Deus divinamente quem Ele é. Enquanto nós tentamos descobrir nossa identidade, Deus nos revela que podemos construir essa identidade nEle sendo não somente quem somos mais sendo e estando juntamente com Ele.

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jeova
há 6 dias

“EuSou”

Santo Agostinho diz: “ se conseguimos definir, com certeza não é Deus”.

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Jormary Nunes
Jormary Nunes
há 7 dias
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Parabéns pelo texto....Somos possibilidades que se atualizam no tempo se entendi bem? A gente não "é" de uma vez por todas... a gente "vai sendo" — com os outros, no mundo.😌

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Convidado:
10 de abr.
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O meu modo de estar no mundo tornou-se um questionamento diário, especialmente a partir de uma aula de Metodologia do Ensino da Geografia há uns 15 anos.

Percebi que minha reflexão sobre o assunto era de modo muito restrito aos limites do plano terrestre. Mas, ao ler o texto, percebo que, na verdade, trata-se de pensar na construção dessa essência que se forma a partir da existência e também sob uma perspectiva espiritual.

E agora, qual é o meu modo de estar no mundo? Eis a questão..

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