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"DEUS ME LIVRE" DA DESIGUALDADE DE GÊNERO




Nesse mês de setembro, o governo federal publicizou informações acerca da desigualdade salarial existente no país. Os dados para a produção do 2º Relatório de Transparência Salarial e Critérios Remuneratórios, que têm origem nas informações que as empresas com 100 (cem) ou mais empregos e empregadas obrigatoriamente devem oferecer ao governo federal, demonstram que neste ano de 2024, a diferença salarial entre homens e mulheres cresceu. Em comparação ao 1º Relatório, que apontava a discrepância de 19,4%, agora é de 20,7% para menos.


É preciso observar que a diferença entre os valores médios dos salários entre homens e mulheres tem significativa alteração quando atravessada pelo critério racial, pois as mulheres negras são as que têm menor média. Não há nada de desconhecido no conteúdo apresentado por esse relatório. Os dados publicados pelo governo federal reforçam o que os movimentos sociais e pesquisadores e pesquisadoras conhecem, vivem e denunciam há muito tempo.


A desigualdade racial e de gênero no Brasil constitui nossa estrutura social, política e econômica, e, articulada às formas de exploração do trabalho, levam à constante precariedade no acesso a bens e direitos bem como a efetividade democrática. As pequenas transformações parecem bastante limitadas, do tamanho de formiguinhas, quando comparadas aos desafios que temos de enfrentar de maneira coletiva e como nação.


Há diversos grupos imbuídos de garantir a manutenção do status quo e até mesmo de retroceder na conquista de alguns direitos. Esses grupos assumem posição em diferentes espaços e sua visão de mundo se perpetua cotidianamente por meio das piadas preconceituosas, feminilização e racialização de profissões em nome de pretensas “vocações”.


Para ilustrar esse cenário de enfrentamentos, trago o caso do executivo do ramo da educação que, abertamente, pediu a Deus que o livrasse de uma mulher CEO. A repercussão negativa fez com que renunciasse aos cargos de CEO e de presidente do conselho e, vejam só, uma mulher assumiu sua posição de CEO. Num primeiro momento, parece uma vitória: reconheceu-se a violência em sua fala, e, numa evidente gestão de crise a fim de evitar danos reputacionais da empresa, colocou-se uma mulher CEO.


Apesar do afastamento deste executivo, quero lembrar que pessoas CEO, no Brasil, tem ínfima representação no cenário apresentado pelo Relatório, que a colocação de uma mulher neste lugar de decisão não exprime nada além de uma mulher nesta posição. Trata-se dela e não de uma política de inclusão e de não discriminação.


A fala do executivo é completamente fora do tom e a gestão da crise promovida pela empresa, para quem está atento às questões de raça, classe e gênero na sociedade brasileira, não significa uma mudança de política institucional que promova a igualdade de oportunidades às mulheres. É mais uma posição centrada na representatividade pautada no biológico, mulher vs. homem, branco vs. negro, homossexual vs. heterossexual, cis vs. trans.


Essas formas de ser e estar expressas nas desigualdades salariais e no comentário do CEO contêm uma matriz racial e de gênero. Para as suas superações, devemos ter muita compreensão do real, energia e luta. O que está em disputa são visões de mundo e ações que rompam efetivamente com desigualdades estruturais ou que as mantêm.


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