* Por Stefanie Moreira
Você já parou pra pensar sobre o modo como você olha e interpreta a si mesmo? E sobre quais influências incidem nesse seu olhar?
A sociedade sempre exerceu influência na maneira como as pessoas se veem. Sempre foi possível verificar as exigências realizadas sobre os corpos, sobretudo os femininos, que deveriam seguir a lógica do corpo ideal. Esses corpos ideais eram apresentados nos cinemas, na TV e apresentados nas capas de revistas. Havia sempre modelos a serem seguidos, como artistas, cantores ou atrizes famosas que construíram uma vida exemplar ao longo de suas carreiras.
Com o advento das redes sociais, é possível ver um alastramento dessas influências sociais sobre a autoimagem das pessoas em relação a outras esferas da vida. Nas redes sociais, obter o corpo dito como ideal socialmente já não é o suficiente. É preciso ter e apresentar por meio de vídeos, stories e fotos, uma vida pessoal e profissional dentro dos moldes ditados pela sociedade atual. Porém, os modelos a serem seguidos foram democratizados e vão desde aquela atriz que fez carreira na TV desde muito pequena e é um ícone, até sub celebridades e anônimos (até dias atrás) que viralizaram nas redes e passaram a ter a vida tão almejada no mundo digital. Aqui a mensagem é clara, qualquer pessoa pode alcançar o sucesso, seja por meio de uma dança que viralizou, uma atuação constante nas redes sociais, ou por meio das diversas fórmulas mágicas que tantos profissionais vendem diariamente nas redes sociais.
Para explanar sobre esse assunto, é importante dizer que a nossa autoimagem é fruto da nossa interação com o contexto social no qual estamos inseridos, sendo assim considerada uma consequência das relações que estabelecemos com os outros e conosco mesmo. A nossa autoimagem é uma construção que começa desde o nascimento até o final da vida, sendo assim, complexa e passível de sofrer muitas influências. Nessa interação com o outro e com o mundo a nossa volta, nós nos reconhecemos, percebemos como sentimos nossas potencialidades, sentimentos, atitudes e ideais. Assim, autoimagem é a forma como nos vemos, a forma como acreditamos que somos (Mosquera & Stobäus, 2006).
Essa nossa percepção é atravessada por interinfluencias constantes, que também estão ligadas às tendências sociais identificadas no contexto ao qual estamos inseridos. No panorama atual, a influência das redes sociais na autoimagem ganha força e ocupa um lugar de destaque. Nessa realidade online, a importância do “ser” abriu lugar para a valorização do “ter”. Assim, as pessoas passaram a serem vistas por aquilo que elas possuíam (bens materiais, objetos de status, posses) e não sobre o que eram (um aluno de destaque, um profissional qualificado, pessoas amigas e companheiras). E como tudo é transitório e volátil na internet, a importância de se ter coisas e mostrá-las, está sendo substituída pelo simples fato de aparentar ter. Você já não precisa ter algo de fato, mas aparentar possuí-las. Neste lugar, tudo se torna descartável e substituível, na qual a imagem é supervalorizada em detrimento dos valores ou aspectos subjetivos (Souza, Freitas & Biagi, 2017).
As redes sociais hoje vão muito além de um espaço de convivência social, elas tornaram-se um dos principais meio de trabalho de muitas pessoas. Neste lugar de interação e atuação, as pessoas podem formatar e construir virtualmente uma vida, muitas vezes mais interessantes que a real e concreta. Nesse lugar, segundo Ávila (2014) as pessoas podem escolher quem querem ser e se tornam “autores da imagem que se projeta por meio de nossa persona social”. Ou seja, o PARECER adquiriu uma importância tão grande como SER e TER na expressão da nossa personalidade. As imagens que representam as pessoas são compartilhadas após uma série de configurações prévias (melhores ângulos, edições, filtros e etc.), o que as tornam uma expressão do que elas gostariam de ser e não a forma que são propriamente ditas. Isso porque, para se ter destaque nas redes sociais é necessário ter um corpo, uma vida e uma profissão instagramável.
Nesse sentido, o pensamento é “eu edito aquilo que eu quero editar sobre a minha vida, e assim eu me projeto como uma personalidade capaz de construir a imagem que as pessoas terão de mim. Seja ela verdadeira ou não”. Assim, a construção da autoimagem é atravessada pela ideia de construção, onde o que é transmitido precisa ser reconstruído e reconfigurado a todo momento para se adequar às exigências mutáveis daqueles que ditam as regras nesses ambientes virtuais, o que pode acarretar uma distorção na maneira de lidar com o “eu real”.
O eu-real é a forma como a pessoa é internamente, já o eu-ideal é a forma como ela gostaria de ser, suas pretensões e desejos. Essa imagem que o sujeito cria e recria de si mesmo, vai interferindo em suas escolhas ao longo de sua vida e quanto mais distância se observa entre o eu-real e o eu-ideal, maior conflito e sofrimento. Ser instagramável pode levar o indivíduo a buscar uma perfeição que é vista e vendida como possível nas redes sociais, mas que de fato não existe. Pessoas passam a comparar a sua vida real constantemente com perfis que mostram imagens milimetricamente construídas de uma pessoa ou uma vida ideal.
Desse modo, é importante discutirmos a influência das redes sociais sobre a autoimagem e a pressão que as pessoas sofrem para seguirem tendências estéticas ou a retratar um estilo de vida e/ou profissional idealizado e imposto pela sociedade. Para aqueles que seguem incessantemente essas tendências as consequências pode ser sobrecarga em prol de uma imagem de vida e profissional impecável, comparações constantes que desencorajam a expressão de sua verdadeira personalidade, insegurança em relação à sua própria imagem e/ou sentimento de impostor ao comparar o eu-real encarado nos momentos íntimos ao eu-ideal transmitido ao público, o que levam as pessoas a acreditarem que estão vivendo uma vida inautêntica.
Para quem não aceita as regras do jogo, cabe a elas o sentimento de inadequação e desajustamento ao que é buscado e valorizado nas redes. As consequências podem ser variadas, como: não despertar o interesse de um potencial date, não chamar atenção de empresas que costumam olhar as redes sociais para realizar a contratação, não vender produtos com facilidade pois apresenta um feed desorganizado, entre outras situações possíveis.
Como uma profissional que usa o Instagram como ferramenta de trabalho, penso e repenso a minha postura online diversas vezes. Já mudei o meu insta em muitas situações, já apaguei tudo na tentativa de “começar do zero”, já tentei trazer somente coisas relacionadas ao trabalho, falhei nessa missão miseravelmente. Enfim, a vida trilhando o seu percurso de idas e vindas. Porém, a pergunta que fica é: qual ideal de imagem que estou tentando passar com esses ajustes? Qual é a imagem que eu tenho de mim? Será que consigo transmiti-la na minha rede social, ou estou simplesmente tentando me encaixar em tendências ditadas pelas redes sociais como as mais adequadas? Você já parou pra pensar nisso em relação a autoimagem que você constrói nas redes sociais?
De todo modo, é importante salientar que a autoimagem é uma construção pessoal e deve ser elaborada a partir da própria visão de si mesmo e não por meio das expectativas de uma sociedade volátil. É preciso desenvolver o autoconhecimento e ter coragem para se libertar das pressões externas, abraçando assim, a sua individualidade.
Algumas dicas para desenvolver uma autoimagem mais positiva dentro das redes sociais é seguir perfis de pessoas com as quais você se identifica, em relação a suas crenças, valores, e estilo de vida que considera saudável e acessível. É importante a gente cultivar conexões com pessoas e marcas que salientem a representatividade da diversidade e alavanquem a importância da autoaceitação. É importante escolher a autenticidade em lugar das pressões para a normalidade construída e, assim, conseguir abraçar e celebrar a própria identidade pessoal e profissional.
É fundamental que as pessoas aprendam a valorizar a si mesmas e a construir uma autoimagem positiva, baseada em suas próprias características e qualidades, independentemente dos padrões impostos pela sociedade e pelas redes sociais.
__________________________________________
Stefanie Moreira. Doutoranda em psicologia pela UFBA. Instagram: stefanie_oliver
Link da imagem: https://www.cvv.org.br/blog/com-que-oculos-voce-enxerga-o-mundo/
REFERÊNCIAS:
Ávila, J. T. M. (2014). O Lugar das Redes Sociais na Construção das Identidades. ARTEFACTUM-Revista de estudos em Linguagens e Tecnologia, 8(1).
Mosquera, J. J. M., & Stobäus, C. D. (2006). Auto-imagem, auto-estima e auto-realização: qualidade de vida na universidade. Psicologia, saúde e doenças, 7(1), 83-88.
Souza, G., Freitas, T. G., & Biagi, C. R. (2017). A relação das mídias sociais na construção da autoimagem na contemporaneidade. Akrópolis-Revista de Ciências Humanas da UNIPAR, 25(2).
Pois é a gente engana o outro mas n engana a si mesmo. Muito bom texto e