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Foto do escritorCarlos Henrique Cardoso

Cadê o impeachment? Sai ou não sai?

Em entrevista para o site Metrópoles, o deputado federal Rodrigo Maia, que está prestes a deixar a presidência da Câmara dos Deputados, afirmou que caso a vacinação contra a COVID demore a se confirmar, um processo de impeachment pode ocorrer “em poucos meses”. Segundo Maia, uma ação de impedimento presidencial necessita de uma “pressão popular” para que avance e é pauta para o próximo presidente da Casa, a ser escolhido em votação interna no próximo dia 2 de fevereiro, quando se inicia o ano legislativo. Maia recebeu durante sua gestão mais de 50 pedidos para implementar o afastamento do presidente, mas nada foi adiante devido à falta de iniciativa da sociedade civil organizada. Será mesmo que somente a vontade do povo empurra a destituição de um Chefe de Estado pra frente?


Os dois processos de impeachment ocorridos – contra Collor e Dilma, respectivamente - ficaram marcados por manifestações que encorajaram os parlamentares a tomar a atitude em definitivo. É necessário um argumento jurídico para que o político entre em cena. Nos dois casos, havia baixa popularidade do presidente, insatisfação legislativa, indignação popular, e pressão das instituições, a exemplo da imprensa. É um somatório de desagrados, acrescidos de crises econômicas, políticas, e sociais. Collor foi abandonado até mesmo por aliados mais próximos. Já Dilma enfrentou um Congresso conspirador, uma oposição intransigente que efetivou boicotes e bloqueios a medidas oriundas do executivo (as chamadas “pauta bomba”), uma imprensa ativa contra sua inaptidão para o cargo, e uma onda de protestos inflamados solicitando sua retirada imediata do cargo. Nesses casos, havia “clima” para trâmites de destituição. Em ambos, houve controvérsia sobre a motivação jurídica, mas interessa aqui a tal “pressão popular” indagada por Maia na entrevista.


Bem, o que não falta é razão para exonerar o atual Presidente da República sob o ponto de vista constitucional. Improbidade Administrativa (apologia à violência, descaso com a pandemia, desobediência à princípios éticos internacionais, ataques ao sistema eleitoral); ingerência na área ambiental; violações a direitos individuais e coletivos de diversos grupos sociais. No entanto, a Casa Legislativa não parece interessada em levar um evento desse adiante. Os representantes do eleitorado não se sentem pressionados por estes para que se efetive um afastamento.


Sendo assim, ao que parece, não basta obedecer aos ditames dos artigos da Carta Magna e assim agir em conformidade. Se há provas para um impedimento utilizando a letra fria da lei, não há indícios para que isso seja operado sob a “letra quente” da política.


Muitos analistas e intelectuais estão indignados e abismados pela lentidão em aplicar o processo de impeachment. “Há motivos suficientes pra isso!” afirmam eles. Porém, vamos fazer um exercício de entendimento para entender o porquê dessa demora.


O presidente tem sido duramente criticado nas redes sociais pelas declarações absurdas – que não são poucas. Pelo contrário! São abundantes. Parlamentares lamentam a língua ultrajante do líder máximo da nação. No entanto, existe uma pauta de reformas há muito desejada por boa parte dos deputados. Essas reformas – administrativa, previdenciária, tributária – vem sendo estudadas e modificadas no Congresso. Há interesses na política econômica e acenos para os projetos do ministro Paulo Guedes. Com isso, o Parlamento interage com o governo através dessa agenda. Um processo de impeachment embolora os compromissos viáveis para centenas de deputados que se conectam com os princípios liberais de Paulo Guedes. Enquanto ele estiver por lá, acenos serão dados e retribuídos, na medida do possível. Ou seja, o Congresso consegue “governar” amaciando algumas dessas pautas.


Segundo órgãos de imprensa, há uma expectativa de reforma ministerial ainda nesse primeiro trimestre. Bolsonaro pode emplacar nomes do chamado “Centrão” – um conglomerado de partidos fisiológicos, que procuram, a cada mandato, se ancorar no governo da vez. Como não é de se admirar, o presidente tende a se aliar a esses grupos a fim de manter a estabilidade de sua administração sem qualquer abalo, nem peso da consciência. Visto como um jogo normal da política corporativa, esse “toma lá, dá cá” evita qualquer plano de afastamento.


As eleições municipais de 2020 evidenciaram a escolha por políticos de partidos tradicionais ou políticos tradicionais continuando seus trabalhos em legendas com representações significativas no Congresso. O eleitor esteve mais inclinado a escapar um pouco da euforia por outsiders, mostrado no pleito de 2018. Com a eleição da presidência da Câmara se aproximando, os dois principais candidatos mostram consonância programática com boa parte dos prefeitos eleitos. Com uma possível liberação de emendas para os novos gestores municipais, aplacam-se movimentos que possam causar ebulição política no país.


A oposição, tão marcante no governo Dilma Rousseff e na primeira gestão do governo Lula, anda um tanto frívola. O primeiro ano de governo foi marcado por dissidências de partidários de Bolsonaro durante a campanha de eleição. Muitos se tornaram oposição. Partidos como PSOL e REDE entram quase sempre com representações legais contra o presidente e membros do governo. Entretanto, nenhuma reação marcante ou impiedosa para impedir o andamento do governo. Apesar das tentativas do presidente em manipular os órgãos de investigação que poderiam avançar em direção a crimes de peculato, o que por enquanto foi inspecionado não alavancou uma repulsa à gestão por corrupção – o fiel da balança para motivar o ódio a um governante. “Rachadinhas”, uso irregular da ABIN, dinheiro de um programa social liderado por Michele Bolsonaro repassado para ONG’s associadas à ministra Damares Alves, cheque de Queiroz na conta da primeira-dama, nada disso tem prosseguimento ou caminha a passos de tartaruga. E a pandemia desarticulou totalmente o Congresso. As seções se dão via on-line e várias matérias são votadas apenas pelos líderes partidários.


Por fim, esses tempos são marcados por pouquíssimas manifestações de repúdio político. Em 2019 ocorreram protestos para reverter os cortes de verbas na educação. Apenas! A classe trabalhadora anda desmobilizada, vide diversos processos de desmonte de direitos e desvinculações sindicais. E nem precisa mencionar o óbvio ululante: o isolamento social impediu qualquer manifesto público em 2020. Como mencionado, o movimento estudantil foi o único que articulou alguma pressão popular, mas com as universidades e escolas paralisadas, nem os estudantes puderam se organizar.


Pra variar, “miséria pouca, é bobagem”: uma pesquisa Datafolha mostrou que 52% dos brasileiros isentaram Bolsonaro de culpa pelas mortes durante a pandemia!! Apenas para 8% ele é o principal culpado (curioso é que para 53%, o país não fez o que era necessário para evitar o número de mortes. E aí eu pergunto: o país, quem???). Na mesma pesquisa, 37% consideraram a gestão do presidente “boa ou ótima”. Com tamanha indiferença para os arroubos declaratórios e descasos de Bolsonaro, realmente fica a pergunta: como um processo de impeachment caminha em um país absorto desse jeito??? Havendo abertura de processo, quem poderia ir às ruas nesse caso? Seus apoiadores! Parte significativa deles já estão se aglomerando por aí.


Existe uma preocupação também pela mania que criamos, desde Collor, em querer tirar o presidente em questão. Apenas Itamar Franco escapou. “Fora FHC”, “Fora Lula”, e “Fora Temer”, já pairaram no Congresso, sem sequência. No caso de FHC e Lula, apenas uma frágil cogitação. Como diz Ciro Gomes, “Impeachment não pode ser remédio para governo ruim”. Apesar dos inúmeros motivos do atual momento, praguejar impeachment a cada governante enfraquece esse instituto. Tirar presidente não é hobby, nem passatempo.


Apesar de tudo isso, nada parece respingar na figura do presidente. O homem tem corpo fechado! Muitos especialistas indicam que ele estará muito provavelmente no segundo turno em 2022. Com isso, não “basta apenas” cumprir a legislação e escorraçar o presidente. Ou melhor, tentar escorraçar. O próximo presidente da Câmara pode destravar isso? Claro que sim. Todavia, um processo derrotado seria um tapa na cara da opinião pública. E um sorriso colgate na boca de Jair.


FONTE:







Imagem: PDT.org







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