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Foto do escritorThiago Araujo Pinho

ALGUMAS DICAS DE COMO NÃO SER UM OLAVO DE CARVALHO




Muitos pensam que a capacidade crítica e reflexiva é alguma energia interna e bem intencionada de pessoas com mente aberta, como acontece em circuitos mais liberais. O que não percebem é o quanto a capacidade de reflexão é um fenômeno externo, presente no próprio mundo, produzida apenas graças a um espaço de resistências, encontros e até frustrações, a exemplo da esfera acadêmica e científica. Ele impede que eu e minhas preciosas ideias saiam do controle, em um delírio especulativo perigoso, e se apoderem do mundo e das próprias circunstâncias. Nós pesquisadores somos críticos não por mérito, não por algo especial dentro de nós, muito menos por razões éticas, mas porque o mundo não nos deixa em paz, porque enfrentamos a resistência dos nossos pares, figuras que apontam os nossos erros e nos forçam a ir além. Se o pensamento é deixado de forma espontânea, sem restrições, a não ser um fluxo descontrolado da minha própria vontade, a paranoia é o único destino, afinal todos amam a conveniência, assim como o delicioso viés de confirmação. Olavo de Carvalho cometeu justamente esse erro, essa armadilha sedutora que a linguagem pode gerar, como percebemos, inclusive, em muitos palestrantes motivacionais.


Já que não passo pela análise dos pares, já que não encontro resistência pelo caminho, o mundo se apresenta como um prolongamento das minhas cadeias de significantes. O principal problema de Olavo não era epistêmico (falta de conhecimento) ou ético (falta de caráter), mas estético, entendido aqui como a impossibilidade de se afetar com um mundo pulsante. Ele foi capturado pelas próprias especulações, preso pela própria linguagem, escravo dos próprios ruídos que saiam de sua boca. Olavo , portanto, além de um perigo para a democracia, é também um alerta aos que não acolhem e até zombam do campo científico e sua dinâmica interna, aos pretensiosos de esquerda ou de direita que acreditam muito no pacote semiótico que carregam no bolso, evitando a todo custo qualquer sinal de resistência.


Observem, mais uma vez, que o problema de Olavo de Carvalho não era simplesmente de caráter, apesar de sua grosseria e arrogância, como também não era um simples detalhe epistêmico, embora suas interpretações de grandes filósofos sejam muito questionáveis. Todos nós somos vitimas de uma estrutura de linguagem paranoica se não encontramos resistência, se não encontramos o outro. O falibilismo de Popper é uma ficção, ao menos da forma liberal como foi pensada. O falibilismo não está na teoria, muito menos nos indivíduos que a manipula, mas no campo de relações, na resistência exercida por um outro que me ultrapassa, que resiste aos golpes do meu desejo. Essa é, inclusive, a ideia de objetividade em Bruno Latour. A objetividade nada mais é do que a característica que objetos tem de objetar, de resistir. Sem essa característica, não apenas o pensamento científico não existe, mas o próprio campo democrático desaparece por completo. O outro é sempre a condição da minha criticidade e não o meu próprio eu enquanto indivíduo incrível e super legal. O outro é o ponto de partida para meu próprio pensamento. Na verdade, o meu pensamento É o próprio outro. Graças aos pares, as revisões, aos congressos, graças aos inúmeros circuitos que filtram, controlam e limitam nossas pretensões, somos capazes de fazer ciência e produzir uma linguagem séria.


O falibilismo deve ser pensado não de forma epistemológica, como uma característica interna de teorias, como imaginava o liberalismo de Popper, mas uma matriz institucional, presente na dinâmica interna dos próprios circuitos acadêmicos. Olavo falhou não porque era burro, não porque era mal, mas porque era insensível com as resistências de um mundo e de uma comunidade acadêmica que transbordava. Ele criou aquilo que Dostoievski tanto temia... ele produziu verdadeiros palácios de cristal, sendo fortalezas tão perfeitas, tão sólidas, tão autosuficientes, que nada poderia entrar, nem mesmo o próprio mundo. O narcisismo da paranoia é evidente quando percebemos que a realidade deixa de ser o que é e passa a se transformar em uma mera extensão de minhas demandas, preferências e até mesmo frustrações. Isso, meus caros, não é ciência... isso é conveniência.



Referências da imagem:


https://congressoemfoco.uol.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Olvado-de-Carvalho.jpg



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Muito bom texto, colega!

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