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Foto do escritorAlan Rangel

Match Point: o realismo de Woody Allen



"O homem que disse: eu prefiro ser sortudo do que bom, enxergou a vida profundamente. As pessoas têm medo de encarar que uma grande parte da vida depende da sorte. É assustador pensar que tanta coisa foge do nosso controle. Existem momentos em que uma partida de tênis a bola bate na fita, e numa fração de segundos, pode tanto ir pra frente como pra trás; com um pouco de sorte ela vai pra frente e você ganha , ou talvez não, e ai você perde".



Essa semana assisti a um filme antigo, de 2006, Match Point. A frase acima é a abertura do filme, do grande diretor Woody Allen. Há claras referências filosóficas, como a obra Crime e Castigo de Fiodor Dostoiévski e o existencialismo. Meu ensaio de hoje é um breve comentário da película. Aviso aos leitores que, sim, tem spoiler.


A trama se passa em Londres, com o recém chegado irlandês, Chris (Jonathan Rhys), ex- tenista que fracassou profissionalmente e foi tentar a sorte como professor em outro país. É leitor de Dostoiévski, e encara a vida como trágica e sem sentido. Seu fracasso como tenista se devia a uma má sorte, diz ele. Na capital inglesa, conheceu Tom ( Matthew Goode), aluno seu, de uma família de classe alta. Tornam-se rapidamente amigos. Chris conheceu Chloe (Emily Mortimer), irmã de Tom, e a deixou encantada. Não demorou para que ambos começassem a sair e ter um caso. Antes, ainda, conheceu Nola (Scarlett Johansson), que era namorada de Tom. No desenrolar da história, Chris namora com Chloe, tendo uma excelente oportunidade de mudar seu status social. Paralelamente, ele flertava com Nola. Chris consegue um emprego na empresa do pai de Chloe. Uma oportunidade de poder assumir um cargo elevado , para um neófito do ramo dos negócios.


Voltando a Nola. Chris se encantou pelos seus belos lábios e seus olhos claros. Scarlett Johansson sabe ser sedutora! Depois que a viu não conseguiu mais parar de pensar nela, mesmo namorando com Chloe. Casou-se com esta. Nola, uma atriz americana do Colorado, EUA, com uma série de fracassos, ou azar na vida, acabou terminado com Tom. Na verdade, a família de Tom nunca aceitou o namoro dos dois, pois achavam que a nora não tinha futuro, além de ser considerada vulgar e sem sorte. Certamente, o peso da crítica da mãe de Tom colaborou para que o mesmo finda-se o relacionamento. Ele acabou se apaixonando por outra pessoa. A volatilidade dos relacionamentos é bem típico dos filmes de Allen.


Chris, por outro lado, casa-se com Chloe. Depois de algum tempo, inesperadamente, por acaso, reencontra Nola sozinha. Depois do reencontro, não a perde mais de vista. Ambos mantém um caso ardene, fervoroso e apaixonante. Uma paixão selvagem, coisa mesmo de pele. Chloe, coitada! não consegue engravidar, por isso é obrigada a fazer um longo tratamento.


Chris mantém uma vida dupla: está com Chloe para manter um padrão social (apesar de ele dizer que a ama) e se sente entediado ao lado dela; mas também se relaciona com Nola. Com ela é uma pulsão efervescente.


De repente, surge algo inesperado na trama: Nola engravida e decide ter o bebê. Ela já tinha abortado duas vezes na vida, mas dessa vez bate o martelo: ameaça Chris para que termine o mais rápido com Chloe.


A situação de Crhis é muito difícil: assumir um relacionamento que não apresentava nenhum futuro para ele, e assim deixar sua belíssima casa, seu emprego, shows, concertos, viagens de campo e todas as mordomias de alguém de classe alta?


Chris, lembrando a personagem de Dostoiévski, Raskólnikov, de Crime e Castigo, faz algo absurdo, que o telespectador não espera: ele decide levar o interesse pessoal acima da moral e dos valores, e arquiteta um crime. Sim, ele terá a coragem de passar por cima de qualquer coisa para manter a sorte ao seu lado, ou seja, uma vida boa. Diferente de Raskólnikov, ele pensa em tirar a vida de duas pessoas: Nola e sua vizinha (um efeito colateral). Contando com o bebê são três vidas. Matar a vizinha é parte do plano para despistar qualquer suspeita sobre a morte da sua amante. A morte da vizinha, de acordo com Crhis, era necessária para um plano maior: manter a boa vida. E eis que ele comete os assassinatos. Durante seu ato macabro, se sensibiliza por alguns instantes. A consciência de Chris o deixa perturbado. Antes de tirar a vida de Nola, chora, se desespera, mas não titubeia, vai em frente e dá um ponto final naquilo que iria atrapalhar tudo que alcançou. Tudo que o dado da sorte havia lançado para seu lado.



Woody Allen



Seu plano foi bem arquitetado, exceto por um diário que Nola escrevia sobre a vida dela, e isso incluía Chris. O investigador do crime teve acesso ao diário, e, em seguida, convoca-o para depor. Ele não acredita que ela o colocaria como um grande suspeito da sua morte. Mas, o protagonista encenou de forma fria e calculista na frente do detetive dizendo que uma atitude imoral não o colocaria como um criminoso. Ele confessa que tinha relações com Nola, mas isso não o incriminaria. Porém, o detetive manteve suas suspeitas.


Chris teve visões com Nola e sua vizinha. A sua consciência, por um curto período, não o deixou em paz, assim como o castigo mental de Raskólnikov. A visão dizia que seria pego, pois o crime não foi perfeito. No outro dia, o detetive acordou com a ideia de que Chris havia arquitetado todo o crime. Mas, algo aconteceu que virou o dado da sorte para o lado do protagonista: usuários de drogas e ladrões viciados presos pela polícia portavam um anel que a vizinha morta possuía. Chris havia se livrado do anel a pouco tempo, jogando na rua. Materializada, aqui, a teoria do caos, no qual uma ação casual geraria uma coisa realmente inesperada. Esse fato acabou por estragar as suspeitas do detetive, e, claro, trazer a sorte de volta para Chris.


Chris e Chloe, finalmente tiveram filhos, e, assim, termina o filme. Um final que está longe de ser justo. Um final no qual a sorte foi superior a bondade. Afinal, a sorte é cega, não escolhe quem é bom ou quem é mau. É bem duro admitir isso, mas essa é a visão de mundo na qual não existe intenção nas coisas. Tudo é mero acaso. A roda da fortuna está sempre girando. Assim, o filme de Woody Allen espelha bem a visão existencialista da vida, com um realismo assustador.



Fontes



Imagem 1

http://1.bp.blogspot.com/_6BH7bmYd8Es/TILWnDO9jhI/AAAAAAAAAJ4/dBfesnFx41E/s1600/match+point.jpg

Imagem 2

https://cinemacao.files.wordpress.com/2012/03/woody-allen.jpg





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