Há algum tempo assisti ao filme “Garota Exemplar”. Já falei sobre essa película anteriormente em uma rede social e retorno para incrementar o que já havia dito sobre ela.
O longa é uma adaptação cinematográfica do livro homônimo da autora Gillian Flynn e tem como base o desaparecimento de uma mulher, esposa do protagonista. A partir daí, ele começa a tentar entender o porquê do sumiço e a história tergiversa entre o pré e o pós-escape. Em um primeiro momento, passamos a construir um entendimento fácil do que aconteceu e desde já consideramos que o enredo se aprofundará para uma típica busca aventureira pela dama perdida em algum lugar. Só então vem a segunda parte com um soco no estômago de quem se deixou levar por uma dinâmica perpetrada por um julgamento prévio e dentro de um contexto lógico. Foi durante essa parte que passei a imaginar o quanto nossa interpretação pode ser fértil e começamos a assistir não apenas mais um drama da sétima arte, mas a realidade diante de seus olhos assistindo não só o filme em tela, mas a turbulência moral no qual esse país está mergulhado.
E por que digo isso? O que teria a ver uma mulher fugindo de um relacionamento frio com a crise política brasileira? Nada! Mas a questão não é simplesmente transpor a história para nossa sociedade, mas a construção daquilo que o filme nas entrelinhas se propõe. Devo já admitir que segundo os meus gostos pessoais o longa é fantástico! E posso garantir que está tudo lá na trama: A farsa da opinião pública, desvios de caráter, a designação do vilão feita pela sociedade, o pré-julgamento, a grávida que se insurge, comenta, opina, e conclui que atitude deve ser tomada, qual o destino e quem é culpado-mor de todos os males. Mas não questionamos muitas coisas que devemos levar em conta a priori. Quem tem acesso aos bastidores? Que realidade transcorre por trás das câmeras? Qual a parcialidade que não enxergamos? Com que frequência lemos ou assistimos algo sem nem sequer se atentar a uma palavra chave ou detectar quem se interessa por tal tipo de narrativa? O filme cai bem para esse momento com tantas máscaras sociais a serem derrubadas, o herói fabricado nas indústrias da informação, os desatentos que não percebem os fatos diante de seus olhos, como o retrato de um casamento enfadonho onde somente um lado analisa e discorre sobre aquilo que mais lhe incomoda nos deixa simpáticos a uma causa. E as perguntas se solidificam após o fim. Quem seria nossa garota exemplar em nosso cenário político? E o marido perdido (personagem de Ben Affleck)? Tudo o que o filme passa de mais óbvio remete àquilo que visualizamos com frequência: só é verdade o que é do meu interesse e o que acredito. O resto é mentira, falácia, danação pra dar nos nervos. No final, fica a sensação de derrota, de seu time ter levado um gol aos 49 do segundo tempo.
Vai caber a cada telespectador saber o que significa o “exemplar” do título. O que lhe é exemplar? A honestidade ou a astúcia? E é por isso que o filme também é fantástico. Prezamos a honestidade como ponto principal, mas esquecemos que recorremos à esperteza como maior refúgio frente as desonestidades que convenhamos considerar.