Ser mãe , padecer no “ paraíso”
- Equipe Soteroprosa
- 12 de ago. de 2017
- 4 min de leitura

Olá caros leitores! Estou de volta para mais um debate , embate , conversa , sobre um tema bastante controverso e ultimamente presente no meu cotidiano , “ O direito ou o dever de procriar , ser mãe ou não ” .
Há alguns meses ocorreu em minha classe, um fato curioso e inconveniente , o qual eu encarei de forma cômica e cínica , características inerentes a minha personalidade . No curso da minha aula de Canto , a prima de meu jovem aluno me interpelou:
- Pró , a senhora é casada?
Eu respondi desconfiada: – Não
- Pró , a senhora tem filhos ?
Eu respondi: – Não , por quê?
- Aaai Pró, é tão difícil encontrar uma pessoa assim na sua idade que não tenha filhos.
Eu arregalei meus enormes olhos e perguntei: - Você acha que tenho quantos anos ?
A garota prontamente respondeu: – Pró , a senhora deve ter a idade de minha mãe , você tem uma “cara de velha”!
Alardeei de forma hilária por todo o Conservatório este pequeno diálogo , investigando com os presentes sobre a minha precoce velhice , minha aparência senil e necessitada dos prodígios da cirurgia plástica. Na própria indústria midiática, belas atrizes na casa dos 30 anos , já não são mais convidadas a serem as mocinhas protagonistas , mas as mães ou tias das mesmas.
Por que após os 30 anos uma mulher é considerada “ anciã “ ?
Por que toda mulher teria obrigação de perpetuar a espécie , sendo geradora de uma longa prole ?
Toda mulher nasce pra ser mãe?
Hoje estou ranqueada , na faixa das mulheres balzakianas , seres felizes , livres , em busca do desenvolvimento intelectual , do reconhecimento profissional , de uma companhia saudável que ofereça , paz de espírito , leveza e alegria , nesses tempos tão angustiosos e sufocantes. No auge dos meus 35 anos, perante uma sociedade arcaica , machista , sexista , teria eu dever de estar unida em matrimônio , constituir família e arrastar em meus braços uma renca de pequerruchos rechonchudos , com belas e rosadas bochechas ?
Porque os valores morais e comportamentais , possuem variáveis astronômicas dependendo do sexo e da idade , revelando visões destoantes sobre o mesmo tema?
Pelos padrões da atual e retrógrada sociedade , um homem na faixa etária dos 30 ou 40 , é considerado jovem , macho alfa , em franca ascensão intelectual e profissional , ainda no auge da sua capacidade física , e caso não viva em conúbio , é porque até o momento não encontrou alguém a altura do grandioso ato, continuando a incessante busca da virtuosa parceira ideal; enquanto uma mulher na mesma faixa etária , é vista como uma senhora , alguém que deveria ter constituído família , que não deve ser agressiva ou aguerrida no seu meio profissional, pois poderia se tornar masculinizada , frígida e que , se por ventura não dispuser de um companheiro , está encalhada , fadada a solidão , amargura e tristeza eternas .
Por quê?
Voltando a social prenhez forçosa , considero que ser mãe ou pai requer uma preparação psicológica , física , espiritual e financeira , uma monumental maturidade , entrega e desprendimento , devendo ser algo programado e desejado , não imposto ou acidental , não podendo voltar atrás , devolver , trocar ou doar , algo imutável e infindo. É hipócrita , mentiroso e antiquado , o mito rosado da mãe feliz , que no parto atinge todo o esplendor da sua feminilidade , sendo invadida instantaneamente pelo sublime , celeste amor , que povoa a mulher de todo conhecimento necessário para lidar com a criança. Mãe também tem depressão , pode repudiar , rejeitar , ter raiva em determinados momentos , ou simplesmente como ser humano imperfeito não estar preparada para lidar com tal situação.
Como não tenho filhos, faço uma leitura apenas hipotética e mental , mas acredito que carregar um Ser dentro de si , deva ser algo extremamente desconfortável , seios doloridos, quase pulsantes , dores de cabeça e cólicas intermináveis , pele se dilatando até o limite , varizes , extremidades inchadas , órgãos sendo comprimidos , corpo perdendo o eixo de equilíbrio , se tornando a cada dia mais pesado e mais frágil. O parto é considerado uma das dores mais dilacerantes , excruciantes da face terrena , uma mãe me definiu de forma bem pitoresca – “Eu vi a morte pegando na minha mão quando eu fui parir” . Após o parto , seu corpo será induzido a um extremo desgaste, suas noites serão mal dormidas , ou não dormidas , despertadas a todo instante para dar mama , trocar fraldas , pôr para golfar , medicar uma cólica , acalmar um dente nascendo , estar atento às infecções de inverno , para que seu bebê não aspire uma quantidade crescente de secreção , ou não sufoque dormindo , pelo próprio peso do pequeno corpo ainda sem mobilidade. Freqüentemente o cotidiano do pai continua equivalente a pré existência da criança , então você mãe , abdicará de seu tempo , sua vida profissional , acadêmica , sua poupança e sua vaidade em prol do pequeno bambino , que crescerá necessitando de atenção , cuidados , carinho , educação , limites e outras cositas pelo restante da sua vida .
Calma leitores e leitoras, não venho levantar bandeira de movimento contrário à perpetuação da espécie , não venho invalidar a maternidade ; inegavelmente existe um laço de amor fortíssimo , anímico , inexorável e por vezes indissolúvel entre mãe e filho , uma mãe é capaz de coisas inimagináveis , sobrenaturais em detrimento da sua cria , levanto o questionamento sobre a ideia equivocada do paraíso maternal , da felicidade utópica e do compromisso social ainda hoje atribuído à mulher , de ser fêmea reprodutora. Levanto o questionamento sobre a mítica mãe perfeita. Antes de sermos mães , somos seres humanos passíveis de erro , antes de sermos mães , somos mulheres com necessidades sui generis e não viemos ao mundo apenas para servir ou realizar desejos e caprichos de uma sociedade adoentada.
Para a reflexão:
Todas as mães são felizes ?
Qualquer mulher “ nasceu “ para ser mãe?
Aguardo ansiosa nosso próximo encontro. Até breve!!!!!