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Foto do escritorEquipe Soteroprosa

Precisamos vigiar os vigilantes

O Brasil, de forma mais perceptível nos últimos três anos, tem sido sacudido por uma onda de denúncias e escândalos que com a ajuda dos meios de comunicação, tem exposto as vísceras de um sistema político apodrecido e sua relação perniciosa com o poder econômico. E assistindo a essa versão brasileira de House of cards, estamos nós, impacientes, esperando o desfecho desta tragicomédia que aqui para nós, já encheu a paciência.


Provavelmente o caro leitor dirá a si mesmo que nisto não há nenhuma novidade e de fato não há mesmo. Contudo, era preciso apresentar primeiro o bolo inteiro, para retirar dele a parte que me interessa. Como este tema por si só possui muitos aspectos e que merecem momentos oportunos para serem analisados, eu gostaria de escolher um deles e iniciar aqui uma reflexão do que me parece ser o lado menos evidenciado, principalmente em redes sociais e imprensa. Me interessa falar hoje sobre a maneira como o poder judiciário e Ministério Público estão acossando os políticos – e por tabela a política – se valendo de métodos no mínimo questionáveis, para levar adiante uma cruzada contra a corrupção entranhada no Estado brasileiro.


As ações realizadas principalmente pela Operação Lava Jato encontram amplo apoio na sociedade, sobretudo naqueles que consideram que “não existe parto sem dor” e que pouco se incomodam com os meios de sua atuação, se o objetivo é por políticos corruptos na cadeia. Se é verdade que as revelações feitas até aqui demonstram a qualidade ruim de nossa representação política, também não é possível admitir ser razoável que passem por cima de princípios constitucionais para levar tal plano a cabo.


Em paralelo com a crise no “andar de cima”, não é segredo para ninguém que vivemos um clima real de insegurança causado pelos inúmeros casos de crimes ocorridos em Salvador e em praticamente no país inteiro. Da mesma maneira, até as pedras da praia de Itapuã sabem que atos violentos, sejam eles cometidos por policiais ou por pessoas comuns, são vistos com bons olhos, quando não aplaudidos literalmente, por indivíduos que enxergam nesse tipo de método uma solução para o problema. O que me parece ocorrer é uma certa afinidade perversa de pensamento entre o “bandido bom é bandido morto” e o “político bom é político preso”.


Nos dois casos, aguardamos o desenrolar da situação e ansiando por respostas para ambos os problemas: tanto uma classe política que tenha minimante padrões éticos de atuação no cuidado com a coisa pública, quanto por uma redução dos índices de violência que nos assustam a cada dia e disseminam uma sensação mista de impotência e fragilidade. Infelizmente as duas situações exigiriam um compromisso e esforço abrangente da sociedade brasileira e principalmente, uma boa dose de paciência, pois não há no horizonte, mudança a curto prazo. O que preocupa nesta questão é que, ante a esse duplo sufocamento, a tentação de buscar soluções mais rápidas nos faça caminhar para uma cegueira deliberada para práticas autoritárias que pretendam resolver tais problemas.


Do que acompanho de discussões sobre a conjuntura política, não observo com a frequência que se deveria, uma preocupação com a maneira por vezes acintosa que operações de combate a corrupção, retirando em alguns casos a dignidade dos alvos da investigação. Também não percebi de forma veemente, protestos quando a então presidente Dilma foi gravada de forma indevida e teve o conteúdo da conversa vazado, expondo de forma lamentável a ocupante do mais alto cargo de nossa república. Noves fora o conteúdo suspeito da conversa com Lula, este foi um dos vários “esculachos” que o movimento do “tenentismo de toga” tem imposto à classe política, que por sua vez sem respaldo moral, se vê acuada entre o juízes e procuradores implacáveis e uma sociedade cansada de desmandos e sedenta por justiça. Para agravar o quadro, uma inútil polarização entre “coxinhas” e “mortadelas”, além de tornar as redes sociais insuportáveis e estragar amizades e reuniões de família, torna qualquer possibilidade de reflexão sobre o assunto emperrada por uma intolerância que impede uma reflexão mais profunda.


A visão inexorável de não pode haver “parto sem dor” e que os excessos cometidos devem ser vistos como necessários com vistas a fim desejado, não é o tipo de discurso que deve animar a esperança de quem aguarda ansiosamente por transformações substanciais no país. Testas tatuadas de “vacilões” e exposição de fotos de políticos presos – estranhamente vazadas – com a cabeça raspada não podem ser vistas como um castigo bem merecido, tampouco se tornar simplesmente um detalhe dentro do quadro geral, mas antes revoltar mentes e corações daqueles que anseiam a mudança desejada sem o método da violência, que em si mesmo nada cria, apenas destrói.


Se posicionar de forma crítica e vigilante diante das práticas dos agentes que estão à frente dessas ações é um preço necessário a ser pago, para que não corramos o risco de ter sofrido as dores das contrações em vão e no fim, vivermos em um Estado policial onde em nome de um ideal de justiça, tudo possa ser possível.

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