Pra que serve a Antropologia?
- Carlos Henrique Cardoso
- 2 de jul. de 2017
- 3 min de leitura
Fico me perguntando se as pessoas identificam o papel da antropologia no nosso cotidiano. Muita pretensão. Não há pesquisas, nem ensaios precisos sobre o conhecimento desta disciplina pela população de modo amplo, sobretudo aquela que não está ambientada com discussões acadêmicas ou que não frequenta universidades (e até mesmo uma grande proporção do corpo discente!). Antropólogo não é nem uma profissão regulamentada e não há a mínima demanda em pautas legislativas para firmá-la. Então quais requisitos de um antropólogo e o que a antropologia abarca?
Essa pergunta remete ao surgimento dessa área atrelada às Ciências Sociais. Diante de um colonialismo crescente nas vastas áreas da América Latina, África e Ásia – capitaneado pelas nações europeias – ocorreram “choques” em relação aos modos de agir e pensar entre dominadores e dominados, ou seja, “diferenças culturais” bastante acentuadas. Não cabe aqui destacar massacres populacionais, conflitos graves, e intervenções políticas drásticas que aconteceram por séculos nesses locais, mas resumir basicamente um destacamento na consolidação destes governos de agentes metropolitanos que passaram a observar o cotidiano dessas populações conquistadas. Suas atividades de subsistência, sua arte, sua língua, seus modos de se relacionar, suas festas, suas observações da natureza, do tempo, suas conexões diversas. Esses observadores foram se especializando e formulando documentos sobre a vida dessas comunidades que até então estavam à margem do progresso tecnológico, das descobertas científicas e dos valores do capitalismo. Em fins do século XIX, muitos passaram a relatar o aprendizado obtido sobre essas “populações tradicionais” nas universidades em atividades de cátedra. Com isso, esses professores e pesquisadores se especializaram no conhecimento desses povos, passando a publicar livros e passarem meses e até anos no convívio diário em algum lugar remoto para apreender modos de vida que não eram mais praticados nas grandes cidades dos países mais desenvolvidos do planeta. Foi a gênese da antropologia e do oficio do antropólogo.
Antes de estabilizada essa nova cadeira curricular nas universidades, geógrafos, historiadores, e até matemáticos e físicos exerciam a prática observadora para coletar dados e publica-los. Após a formação dos primeiros antropólogos, estes passaram a cumprir missões de Estado: eram contratados por chefes de governo para realizarem estudos sobre grupos sociais que passariam por alguma interferência estatal, e passaram a intermediar a adoção de novas medidas. Muitos textos clássicos da disciplina foram produzidos nesse contexto. Seja em algum ponto do Himalaia, das regiões subsaarianas, da Amazônia, ou no convívio com índios norte-americanos ou esquimós, lá estava o antropólogo cumprindo sua atividade que passou a ser conhecida como etnografia, nada mais que os registros adquiridos sobre as características de um determinado segmento social.
O tempo foi passando e o antropólogo também passou a focar nos espaços urbanos, e passou a fazer suas observações sobre grupamentos de jovens, moradores de condomínio, pichadores, usuários de drogas, segmentos religiosos e se atentar a todo tipo de novidade que passava a circular. Basicamente, o antropólogo é responsável em detalhar ritos e a se interessar pelas experiências das pessoas em suas relações com o sagrado, com as celebrações, com o amor, com a morte, e outras vertentes. Nos textos de um antropólogo podem estar catalogados uma ciranda infantil; os passos de uma dança de salão; as doutrinas de uma denominação cristã; o preparo de um doce; ou, no meu caso, o regozijo e as fantasias presentes nos festejos carnavalescos. Podem também refletir conflitos entre populações ribeirinhas e empreendedores de projetos industriais; a expansão de grandes latifúndios sobre áreas indígenas; os preconceitos vigentes sobre ritmos musicais “popularescos”; as dificuldades na colheita do babaçu; o declínio dos Ternos de Reis, e outras preocupações.
Os textos a serem publicados sobre o viés antropológico também vão abranger questões da pauta nacional, sempre lançando um olhar para as condições dos indivíduos naquele contexto apresentado, focando em dimensões acerca do que o assunto debatido reverbera nas pessoas. Apesar de mirar em várias direções e analisar o que está nas entranhas das conexões sociais e culturais, a antropologia ainda passa despercebida, sem ser muito notada ou visualizada.
Este texto acabou por ser deveras didático. Mas pelo menos se propôs uma pequena introdução ao universo da antropologia. Que se propague seus interesses e que todos possam vir a fazer também sua observação sobre a disciplina e sua importância.